PARECER
Nº 0075 - 3.20/2011/JPA/CONJUR/MP
INTERESSADO:
Coordenação-Geral de Elaboração, Sistematização e Aplicação das Normas deste
Ministério – CGNOR/SRH/MP.
ASSUNTO: Questionamento
acerca da compatibilidade de horário de servidor que exerce cargo de médico em
duas unidades federativas distintas.
I –
Acumulação de cargos públicos em unidades distintas da federação.
II –
inexistência de óbice constitucional ou legal.
III
– Necessidade de observância do limite de 60 (sessenta) horas semanais.
Aplicação do Parecer AGU nº GQ – 145/1998.
IV –
Considerações em torno da necessidade de se observarem garantias sociais
previstas no art. 7º da CRFB/88. Ilicitude de acumulação que implique supressão
de direitos constitucionais.
V –
Pela restituição dos autos à CGNOR/SRH/MP.
1.
Vêm
à análise e manifestação desta Consultoria Jurídica – CONJUR/MP, órgão
de
execução da Advocacia-Geral da União - AGU, consulta oriunda da
Coordenação-Geral
de Elaboração, Sistematização e Aplicação das Normas deste Ministério –
CGNOR/MP, articulada por meio da Nota Técnica nº
17/2011/CGNOR/DENOP/SRH/MP, de
12 de janeiro de 2011 (fls. 17/21), referente a questionamentos
relacionados à
possibilidade de acumulação de cargos de médico em órgãos situados em
Unidades
distintas da federação.
2.
A
CGNOR/SRH/MP expôs os fatos relevantes à compreensão da controvérsia e,
alfim, formulou os questionamentos que constituem o cerne desta
consulta, verbis:
2.
Consta do presente processo a situação funcional do servidor em comento, que,
no momento da posse no cargo de Perito Médico Previdenciário do INSS, na cidade
de São Luiz dos Montes Belos/GO, já possuía outro vínculo público efetivo no
Hospital das Forças Armadas – HFA, em Brasília/DF.
3.
A dúvida suscitada se refere às diferentes Unidades da Federação (UF), uma vez
que o interessado ocupa os cargos de Perito Previdenciário, em exercício no Estado
do Goiás, com jornada de trabalho de segunda a sexta-feira das 08:00 às 12:00 h
e das 14:00 às 18:00, com carga horária de 40 horas semanais, e o de Médico
Cardiologista, em exercício no Distrito Federal, com jornada de trabalho aos
sábados de 07:00 às 13:00 h e aos domingos das 07:00 às 19:00 h, onde totaliza
carga horária de 20 horas semanais.
[...] omissis
16.
Considerando que à Consultoria Jurídica, na condição de órgão setorial da Advocacia-Geral
da União, compete fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados
e dos demais atos normativos pertinentes à sua área de competência, a ser
uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da Administração, vem esta
Coordenação-Geral, Sistematização e Aplicação das Normas solicitar
interpretação acerca do seguinte:
a)
É possível a acumulação de cargos em Unidades de Federação distintas?
b)
Há necessidade de observância do art. 7º da Constituição Federal para fins de
acumulação de que tratam os autos (40 horas com 20 horas semanais)?
c)
Há que se observar número mínimo de horas de descanso entre a jornada de
trabalho para fins de acumulação de cargos? (Grifou-se)
3.
É
o sucinto relatório.
4.
O
objeto central da consulta está em saber se é possível que o servidor
público
Lenine André Negreiros Vasconcelos acumule dois cargos de médico, um
vinculado
à Agência do Instituto de Seguridade Social – INSS situada na cidade de
São
Luiz de Montes Belos, no Estado de Goiás, e outro no Hospital das
Forças
Armadas – HFA localizado em Brasília – Distrito Federal.
5.
Acerca
da acumulação de cargos públicos, impende trazer à baila os
dispositivos
constitucionais que tratam da matéria, quais sejam, os incisos XVI e
XVII do
art. 37 da CF/88, que versam sobre a vedação genérica relativa à
acumulação
remunerada de cargos, empregos e funções públicas, disciplinando, de
igual
modo, as exceções a esta vedação constitucional. Vejamos:
Art. 37. A
administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte:
[...] Omissis
XVI - é vedada a
acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade
de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI:
a) a de dois cargos
de professor;
b) a de um cargo de professor
com outro técnico ou científico;
c) a de dois cargos
ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões
regulamentadas;
XVII - a proibição de
acumular estende-se a empregos e funções e abrange autarquias, fundações,
empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e
sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público;
(grifou-se)
6.
Da
análise dos dispositivos constitucionais acima colacionados, podem ser
extraídas as seguintes ilações: a) a vedação à acumulação de cargos é a
regra
no sistema constitucional vigente; b) a Carta Política não interdita
qualquer
forma de acumulação, mas apenas a “acumulação remunerada”; c) a
Constituição estende a proibição de acumulação remunerada tanto a cargos,
empregos e funções públicas na Administração Direta, Autarquias,
Fundações, Empresas Estatais e suas subsidiárias, e, inclusive, sociedades
controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público; d) as exceções à regra
que veda a acumulação condicionam-se à existência de compatibilidade
de horários e se restringem à possibilidade de ocupação simultânea
de apenas dois cargos, empregos ou funções públicas.
7.
Tratando
do tema em nível infraconstitucional, a Lei nº 8.112, de 1990, dispõe
ainda que, verbis:
Art. 118. Ressalvados os casos previstos na Constituição, é vedada a
acumulação remunerada de cargos públicos.
§ 1o A proibição de acumular estende-se a cargos, empregos e funções
em autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia
mista da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Territórios e dos
Municípios.
§ 2o A acumulação de cargos, ainda que lícita, fica condicionada à comprovação
da compatibilidade de horários.
§ 3o Considera-se acumulação proibida a percepção de vencimento de cargo
ou emprego público efetivo com proventos da inatividade, salvo quando os cargos
de que decorram essas remunerações forem acumuláveis na atividade. (Incluído
pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
Art. 119. O servidor não poderá exercer mais de um cargo em comissão,
exceto no caso previsto no parágrafo único do art. 9o, nem ser remunerado pela
participação em órgão de deliberação coletiva. (Redação dada pela Lei nº 9.527,
de 10.12.97)
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica à remuneração
devida pela participação em conselhos de administração e fiscal das empresas
públicas e sociedades de economia mista, suas subsidiárias e controladas, bem
como quaisquer empresas ou entidades em que a União, direta ou indiretamente,
detenha participação no capital social, observado o que, a respeito, dispuser
legislação específica. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.225-45, de
4.9.2001)
Art. 120. O servidor vinculado ao regime desta Lei, que acumular
licitamente dois cargos efetivos, quando investido em cargo de provimento em
comissão, ficará afastado de ambos os cargos efetivos, salvo na hipótese em que
houver compatibilidade de horário e local com o exercício de um deles,
declarada pelas autoridades máximas dos órgãos ou entidades envolvidos.(Redação
dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
8.
Conforme
se vê, nem a CRFB/88 e tampouco a Lei nº 8.112/90 cuidaram de fixar um
limite máximo de tempo para a jornada de trabalho de servidores que
acumulam
licitamente cargos públicos. Tal não significa dizer, por óbvias razões,
que
estariam autorizadas jornadas demesuradas, sem
qualquer limitação temporal.
9.
A
propósito da questão atinente à inexistência de limitação legal da
jornada de
trabalho de servidores em regime de acumulação de cargos, a
Advocacia-Geral da
União – AGU, órgão a quem a Constituição Federal confiou a tarefa de
consultoria
e assessoramento jurídico ao Poder Executivo, exarou substancioso
Parecer
(Parecer nº GQ – 145, que adotou, para os fins do art. 41 da Lei
Complementar
nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, o PARECER Nº AGU/WM-9/98, de 16 de
março de
1998, da lavra do Consultor da União, Dr. WILSON TELES DE MACÊDO), no
qual
foram abordados alguns pontos controvertidos a respeito do tema.
10.
No
que interessa ao caso tratado nestes autos, convém dizer que o citado
parecer vinculante sustentou que, embora inexista expressa disposição
constitucional ou legal que imponha um limite de horas à jornada de
trabalho do
servidor sujeito a regime de acumulação, existiriam limitações
implícitas,
decorrentes da necessidade de se ofertar aos agentes públicos condições
dignas
para o exercício das funções que lhe são legalmente cometidas, bem como
para
lhes proporcionar tempo e condições de convício social.
11.
Dessa
forma, o Parecer nº GQ nº 145 sustentou a aplicação analógica de
algumas disposições
normativas de índole protetiva previstas na
Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT, sobretudo aquela que impõe a
necessidade de observar-se um intervalo interjornadas de, no mínimo, 11 (onze)
horas.
12.
Neste
sentido, impende destacar os seguintes excertos do Parecer nº GQ 145, in
verbis:
14. O princípio da
proibição da acumulação de cargos e empregos, inclusive com a ressalva
destacada acima, tem por escopo o primado da coisa pública. As exceções
estabelecidas não objetivam "privilegiar gratuitamente ou diferençar
pessoas de forma desarrazoada. Não é em seu proveito que se permitem casos de
acumulação. Não é para que um servidor passe a ser mais poderoso ou mais
afortunado"(Comentários à Constituição do Brasil, Celso Ribeiro Bastos,
São Paulo: Saraiva, 1992, 3º vol, tomo III, p. 123).
15. De maneira
consentânea com o interesse público e do próprio servidor, a compatibilidade
horária deve ser considerada como condição limitativa do direito subjetivo
constitucional de acumular e irrestrita sua noção exclusivamente à
possibilidade do desempenho de dois cargos ou empregos com observância dos
respectivos horários, no tocante unicamente ao início e término dos expedientes
do pessoal em regime de acumulação, de modo a não se abstrairem
dos intervalos de repouso, fundamentais ao regular exercício das atribuições e
do desenvolvimento e à preservação da higidez física e mental do servidor. É opinião de Cretella Júnior que essa compatibilidade "deve
ser natural, normal e nunca de maneira a favorecer os interesses de quem quer
acumular, em prejuízo do bom funcionamento do serviço público"(Op.
cit.).
[..] omissis
18. Condições tais de
trabalho seriam até mesmo incompatíveis com o fim colimado pela disciplina
trabalhista, ao estatuir o repouso de onze horas, no mínimo, entre duas
jornadas: este tem o fito de salvaguardar a integridade física e mental do
empregado e a eficiência laborativa, intenção que,
obviamente, não foi desautorizada pelo constituinte na oportunidade em que excepcionou
a regra proibitiva da acumulação de cargos, até mesmo porque estendeu aos
servidores públicos as normas trabalhistas sobre o repouso, contidas nos itens
XIII e XV do art. 7°, a teor do art. 39, § 2°, ambos da Carta Federal.
[..]
24. Tem-se como
ilícita a acumulação de cargos ou empregos em razão da qual o servidor ficaria
submetido a dois regimes de quarenta horas semanais, considerados isoladamente,
pois não há possibilidade fática de harmonização dos horários, de maneira a permitir
condições normais de trabalho e de vida do servidor. (grifos aditados)
13.
Recentemente,
a Advocacia-Geral da União – AGU enfrentou uma vez mais o tema em
apreço, por meio da Nota nº 114/2010/DECOR/CGU/AGU, da lavra da i.
Advogada da
União Isabela Rossi Cortes Ferrari. Tal manifestação contou com a
chancela dos
i. Coordenadores-Gerais do Departamento de Orientação e Coordenação de
Órgãos
Jurídicos - DECOR/CGU/AGU e da i. Consultora-Geral da
União Substituta, tendo sido, por fim, aprovada pelo Excelentíssimo
Advogado-Geral da União – AGU, por meio de despacho datado de 5 de novembro de
2010 (documentos anexos).
14.
Constam
da Nota nº 114/2010/DECOR/CGU/AGU as seguintes ponderações sobre a
necessidade de se manter incólume o entendimento consubstanciado no o
Parecer
nº GQ – 145, verbis:
24.
A partir dessa constatação, duas questões se colocam:
i) é possível
instituir limite único de jornada para todos os servidores, ou seria necessário
atentar-se às especificidades dos casos concretos?
ii) e. caso se admita
a instituição de limite único, o limite máximo de 60 horas semanais considerado
aceitável por esta instituição é adequado ou necessita ser revisto?
25.
No que tange ao primeiro questionamento, consideramos
inexistir qualquer óbice à instituição de limite único para todas as
categorias. De fato, a limitação de jornada diz respeito à capacidade humana de
produzir, que é finita, e à necessidade de repouso para que o indivíduo se
recupere e se insira adequadamente na sociedade em que vive, estabelecendo
laços de fraternidade e fortalecendo seus laços familiares.
26.
Percebe-se, assim, que a referida limitação se relaciona
intimamente com a dignidade da pessoa humana, fundamento do sistema jurídico
pátrio (art. 1Q , 111, CRFB). Por decorrer de circunstância afeta à condição
humana, o fato de algumas categorias desenvolverem atividades em regime de
horário distinto das demais não afasta as conclusões aqui apresentadas. Se os
profissionais da área da saúde podem laborar em regime de plantão de 12 ou 24
horas, é de se imaginar que, para a sua recuperação, demandem mais tempo do que
aqueles que trabalham em jornadas diárias de até 8 horas.
27.
Esse raciocínio foi adotado também pela Consolidação das Leis do Trabalho, que,
ao estatuir as regras referentes à jornada máxima e ao período de repouso, não
distinguiu entre trabalho manual e intelectual, nem entre as diversas
categorias de trabalhadores.
[...] omissis
34.
Resta perquirir se o limite estabelecido por esta
Advocacia-Geral da União no PARECER GQ-145, de 60 horas semanais, é adequado.
35.
A referida limitação da jornada decorre de cálculo que parte
da premissa de que ao servidor deve ser concedido intervalo interjornadas de,
ao menos, 11 horas. Inspira-se em dispositivo da CLT que prevê este intervalo
mínimo para os trabalhadores. Assim, admite-se que o servidor desempenhe suas
funções durante os cinco dias úteis, em dois turnos diários de 6 horas cada,
sendo-lhe concedida uma hora para almoço, deslocamento e repouso antes do
segundo turno. [...] Omissis
47.
Dessa forma, diante da ausência de posição consolidada
acerca da matéria no âmbito da jurisprudência pátria e do Pretório Excelso a
justificar a modificação do posicionamento adotado no PARECER GQ-145. e da
razoabilidade do limite imposto em tal manifestação, pugnamos por sua
manutenção.
(Grifou-se)
15.
Deve-se
ter presente que o Parecer nº GQ – 145, cujo entendimento foi
secundado pela Nota nº 114/2010/DECOR/CGU/AGU e é corroborado por
julgados do
Tribunal de Contas da União TCU (vide Acórdão 2133/2005, 1ª Câmara, TC –
013.780/2004-0), em nenhum momento afirma categoricamente que o servidor
que se
encontrar em regime de acumulação com jornada máxima de 60 (sessenta)
horas
teria, ipso facto,
direito subjetivo à acumulação de cargos públicos, independentemente da
observância e qualquer outro requisito ou condição. A fixação da limitação em
60 (sessenta) horas não constitui uma condição necessária e suficiente para se
autorizar a acumulação. Trata-se, ao revés, de uma limitação ao exercício de um
direito, e não de um requisito indispensável a esse exercício. O fato de se
respeitar o limite de 60 (sessenta) horas semanais não dispensa a observância
de outras normas vocacionadas à proteção da saúde do
trabalhador.
16.
Isso
porque casos haverá em que, mesmo observada a limitação de 60
(sessenta)
horas semanais, restarão desrespeitados alguns princípios, regras e
razões que
inspiraram a edição do Parecer GQ nº 145. Senão vejamos.
17.
A
jornada de trabalho a que o servidor Lenine André Negreiros Vasconcelos
está
submetido pode ser resumida a partir das informações constantes do
quadro
abaixo:
Agência do
Instituto de Nacional de Seguridade Social na cidade de São Luis de Montes
Belos - Goiás |
Hospital das Forças
Armadas – Brasília/DF |
|||||
Terça |
Quarta |
Quinta |
Sexta |
Sábado |
Domingo |
|
8:00 às 12:00h |
8:00 às 12:00h |
8:00 às 12:00h |
8:00 às 12:00h |
8:00 às 12:00h |
7:00 às 13:00 |
7:00 às 19:00h |
14:00 às 18:00h |
14:00 às 18:00h |
14:00 às 18:00h |
14:00 às 18:00h |
14:00 às 18:00h |
18.
Acresça-se
a esse quadro o fato de o servidor exercer as suas atividades em
órgãos/entidades situados em municípios que distam 320 Km (trezentos e
vinte
quilômetros).
19.
Pois
bem. Um rápido lance de vista sobre essa tabela permite concluir que o
servidor está sujeito a jornadas que, uma vez somadas, não superam o
limite de
60 (sessenta) horas semanais, não obstante caracterizem um regime
estafante de
trabalho.
20.
Isso
porque os regimes referentes aos dois cargos ocupados pelo servidor
subtraem-lhe qualquer possibilidade de convívio social e, sobretudo,
retiram-lhe o direito de fruição ao “ao repouso semanal remunerado”
(art. 39, §3º c/c art. 7º, inciso XV, da CRFB/88[1]). Não é ocioso lembrar que um direito
deste jaez ostenta nítida natureza indisponível, insuscetível de ser renunciado
pelo servidor, em face da finalidade maior que informa o conteúdo desse
direito/garantia: tutelar a dignidade existencial do servidor/trabalhador.
21.
Não
se pode perder de vista, ainda, que significativa parcela do tempo que
seria, em tese, destinado ao descanso entre jornadas é despendida com o
deslocamento do servidor entre as cidades de Brasília – DF e São Luis de
Montes
Belos – Goiás (vide declaração de fl. 06, subscrita pelo próprio
servidor
Lenine André Negreiros Vasconcellos). É intuitivo concluir que o tempo
gasto
com deslocamento entre as cidades compromete seriamente a finalidade do
repouso
interjornadas, cuja aplicação ao servidor público em regime de
acumulação de
cargos foi destacada no item 18 do Parecer Vinculante nº GQ – 145.
22.
Essas peculiaridades que circundam o caso ora analisado denotam a
impossibilidade de se sustentar o entendimento que a limitação ao regime de 60
(sessenta) horas semanais de trabalho seria uma condição suficiente e
necessária para autorizar a acumulação de cargos públicos. A compatibilidade
de horários reclamada pela Constituição Federal não há de ser entendida a
partir do parâmetro único do somatório das jornadas de trabalho. Deve
ela ser encarada sob duas perspectivas diversas: primeiramente, tomando por
base a própria condição existencial do servidor, que não poderá ser privado e
tampouco se privar voluntariamente do tempo necessário ao seu repouso, à
preservação de sua higidez física e mental e ao desenvolvimento de atividades
relacionada a sua vida privada; sob outro prisma, é mister considerar o
interesse da Administração Pública em ter à sua disposição um agente física e
mentalmente apto a desenvolver regularmente as suas atribuições, sem
comprometer a idéia de eficiência que permeia a
atuação do Poder Público (art. 37, caput, CRFB).
23.
Com efeito, nos casos em que o exercício simultâneo de cargos públicos
implique supressão de direitos sociais previstos na CRFB/88 (v.g, repouso
semanal remunerado), não será lícito falar em compatibilidade de horários.
O simples fato de inexistir choque ou superposição de horários entre as
jornadas dos cargos acumulados não dispensa a observância das normas
constitucionais de natureza cogente incidentes sobre a relação travada entre o
servidor e a Administração Pública. Não se pode defender a idéia
de compatibilidade de horários contra constitutionis
ou à margem das disposições constitucionais referentes aos direitos sociais
do trabalhador/servidor.
24.
No caso em análise, a permissividade em relação à possibilidade de acumulação
de cargos em órgãos ou entidades situados em unidades federativas distintas
acarreta, sem dúvida alguma, um dúplice prejuízo ao interesse público, seja em
razão da inobservância manifesta de normas e princípios protetivos
à saúde, segurança e ao bem-estar físico e mental do servidor, seja porque, em
tais condições de trabalho, o agente não estará apto a exercer a contento as
atribuições de algum – ou até de ambos - os cargos públicos que ocupa.
25,
Do
quanto se vem de aludir, tem-se que as indagações formuladas pela
Coordenação-Geral
de Elaboração, Sistematização e Aplicação das Normas deste Ministério –
CGNOR/SRH/MP devem ser respondidas nos seguintes termos:
a)
inexiste, na Constituição Federal e na legislação federal de regência, vedação
à acumulação de cargos públicos em entidades ou órgãos situados em unidades
distintas da Federação;
b)
por força da norma de extensão prevista no §3º, do art. 39 da Carta Política, é
obrigatória a observância dos comandos normativos previstos no artigo 7º da
CRFB/88, notadamente a garantia do repouso semanal remunerado,
preferencialmente aos domingos (inciso XV) e a garantida de redução dos riscos
inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso
XXII);
c)
é obrigatória a observação de intervalo mínimo entre jornadas, nos termos do
parágrafo 18 do Parecer nº GQ – 145, vinculante para toda a Administração
Pública Federal, consoante prescrição do art. 40, §1º, da Lei Complementar nº
73/93[2].
26.
Ante o exposto, opina-se pela restituição dos autos à Coordenação-Geral de
Elaboração, Sistematização e Aplicação de Normas deste Ministério – CGNOR/SRH/MP,
para ciência dos termos deste parecer.
À
consideração superior.
Brasília, 25 de
janeiro de 2011.
JOÃO PEREIRA DE ANDRADE FILHO
Advogado da União
De acordo. À
consideração do Sr. Consultor Jurídico.
Em
/01/2011.
EMMANUEL FELIPE
BORGES PEREIRA SANTOS
Advogado
da
União
Coordenador-Geral
Jurídico de Recursos Humanos
I. Aprovo.
II. Restituam-se os autos à CGNOR/SRH/MP,
conforme sugerido.
Em /01/2011.
WILSON DE CASTRO JUNIOR
Consultor Jurídico
[1] Art. 39. A União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua
competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da
administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.
[...] omissis
§ 3º Aplica-se aos servidores
ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII,
XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos
diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Art. 7º São direitos dos trabalhadores
urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
[...] omissis
XV - repouso semanal remunerado,
preferencialmente aos domingos;
[2] Art. 40. Os
pareceres do Advogado-Geral da União são por este submetidos à aprovação do
Presidente da República.
§ 1º O parecer aprovado e publicado juntamente com o despacho presidencial
vincula a Administração Federal, cujos órgãos e entidades ficam obrigados a lhe
dar fiel cumprimento.